quinta-feira, março 17, 2005

Podia ser diferente

Não é com base numa curta viagem de dez dias que tenho uma argumentação muito sustentada, mas o que é certo é que nos dez dias que passei há pouco tempo em Toronto, Canadá, as coisas são bastante diferentes.

Há uma coisa chamada civismo.

As pessoas "sabem conduzir". Passam por todo o lado da estrada mas o que é certo é que funciona. Os semáforos estão logicamente colocados do outro lado do cruzamento (rotundas? o que é isso?). Ceder passagem aos peões pois claro.
Carros nem seriam precisos. A rede de transportes está toda ligada, e até funciona dia e noite. Fantástico não?...

Posso pedir caramelo extra no meu sundae que não me respondem de má cara, mas com um sorriso.

Como digo, dez dias são o que são, mas que se nota a diferença, lá isso nota. E nota-se mais no regresso. uau, voltei à terrinha!

Farto...

... da incompetência das pessoas, das máquinas (pessoas), dos serviços (pessoas), da falta de organização (pessoas), ... O problema é do país? Dos portugueses? E já agora portuguesas não vá ferir susceptibilidades.

Faltam vinte minutos para a aula, o estudante chega à cantina para almoçar, está quase um quilómetro de fila, ok, vamos à faculdade do lado, boa, está pouca gente, chegada a hora de ser servido: "desculpe menino, mas já não há isso, agora só hamburgers". Boa, ainda bem que paguei o almoço pensado que ia comer uma coisa que já não há. "Mas vai ter de esperar um bocadinho porque estão a acabar de fazer"... Dá para se organizarem ou não?

Está a senhora na caixa para pagar a peça de roupa que quer levar, está no supermercado, está na loja X. Há vinte caixas, mas é claro que só duas é que estão abertas, e quando chega a hora de pagar o multibanco pode muito bem não funcionar.

A culpa é claro de quem? do cliente pois claro. Com má cara se recebe o cliente. "Desculpe mas eu não tenho a culpa".

O trânsito... buzinas... farto!

Segue o desabafo no post seguinte...

quarta-feira, março 16, 2005

Os Medos, José Cutileiro

É a medo que escrevo. A medo penso,
A medo sofro e empreendo e calo.
A medo peso os termos quando falo.
A medo me renego, me convenço.

A medo amo. A medo me pertenço.
A medo repouso no intervalo
De outros medos. A medo é que resvalo
O corpo escrutador, inquieto, tenso.

A medo durmo. A medo acordo. A medo
Invento. A medo passo, a medo fico.
A medo meço o pobre, meço o rico.

A medo guardo confissão, segredo,
Dúvida, fé. A medo. A medo tudo.
Que já me querem cego, surdo e mudo.

José Cutileiro, "Os medos" in Versos da mão esquerda, 1961.