segunda-feira, novembro 27, 2006

Não à pergunta

«Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras 10 semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?»

Tal como em 1998, esta é a pergunta à qual os portugueses devem responder "sim" ou "não". Tal como em 1998 as dúvidas sobre a pergunta mantêm-se, repetindo-se o resultado da aprovação sobre a consulta com sete juízes a favor e seis contra.

A esta pergunta a minha resposta é não, o que não quer necessariamente dizer que seja, como muitas vezes se ouve, contra o aborto. Ser a favor ou contra o aborto é obviamente uma questão muito complexa que não pode ser resumida desta forma, sem ter em conta muitos factores. A pergunta é redutora e confusa e sendo o ponto de partida errado, o percurso não será com certeza sereno.

Esta é uma questão central no debate político e não pode ser bandeira de movimentos feministas ou religiosos. Quanto à questão da mulher, o que a pergunta diz é que se trata de uma decisão exclusiva da mesma a de abortar ou não. Posso perfeitamente discordar desse aspecto não sendo por isso "contra o aborto". Não é, obviamente, minha pretensão apresentar aqui uma solução para o problema, mas a opção não pode ser em todos os casos apenas de uma das partes. Esse aspecto é para mim suficiente para o não, mas aqui ainda estamos no campo dos valores e da opinião de cada um.

Passando para o campo legal, a questão revela-se inconstitucional. Se a Constituição portuguesa afirma que "a vida humana é inviolável" (art. 24.º) e impõe que a lei garanta "a identidade genética do ser humano" (art. 26.º, nº3), a pergunta não pode nunca ser formulada desta forma. Muda-se a pergunta, ou muda-se a Lei.

Errado é considerar que esta é uma questão do foro íntimo das mulheres ou uma questão religiosa, como errado é também cair em estereótipos do tipo "os direita são contra e os de esquerda são a favor", parecendo que se torna obrigatório rotular politicamente as posições tomadas.

Se o assunto fosse de fácil digestão não daria azo a tanta discórdia, mas se complexas questões geram um grande debate sobre o aborto, menos difícil é perceber o "não" a esta pergunta.